A DeepSeek, empresa chinesa que desafia os gigantes do Vale do Silício e a liderança dos EUA em inteligência artificial (IA) é uma startup fundada por Liang Wengfeng, um jovem entusiasta da tecnologia com experiência no mundo corporativo. Nascido em 1985, Wengfeng é considerado não só um prodígio da computação, mas também das finanças.
Ele se formou em engenharia na prestigiosa Universidade de Zhejiang, em Hangzhou, onde diz ter se convencido de que a IA “mudaria o mundo”. Ele passou anos tentando aplicar a IA em vários campos, de acordo com uma entrevista que deu no ano passado ao site chinês Waves.
Por volta de 2015, ele fundou a High-Flyer, uma empresa de investimentos especializada no uso de IA para analisar as tendências do mercado de ações. Sua técnica permitiu que ela atingisse dezenas de milhares de yuans de ativos sob gestão, tornando-a um dos principais fundos de cobertura quantitativos da China.
— Nós simplesmente fazemos as coisas em nosso próprio ritmo, calculamos os custos e os preços. Nosso princípio não é subsidiar [o mercado] ou gerar lucros enormes — explicou Liang Wendfeng na época.
Mais ‘nerd’ que chefe
De acordo com o Financial Times, em 2021, Liang começou a comprar processadores gráficos da americana Nvidia para um “projeto paralelo”, algo confirmado por um veículo de comunicação local.
Liang “não era nem um pouco como um chefe, mas mais como um nerd” com uma “capacidade de aprendizado assustadora”, disseram seus associados ao Waves.
Esse “projeto” paralelo, à margem dos mercados de ações, era um chatbot baseado em IA generativa: um produto que, agora, está abalando o universo tecnológico dos EUA. E também aproximou Liang Wenfeng dos bastidores do poder chinês.
O governo chinês e diversos segmentos da China estão exultantes com o êxito da DeepSeek ao apresentar um modelo de IA generativa no mesmo nível do que há de mais avançado nos EUA, que presumia-se na liderança da atual corrida tecnológica.
O empresário apareceu na semana passada ao lado de outros representantes importantes do mundo dos negócios durante uma reunião com o primeiro-ministro Li Qiang. Imagens da televisão estatal CCTV mostraram um homem de óculos de aro grosso ouvindo atentamente o primeiro-ministro.
‘Vale do Silício Chinês’
Embora pareça ter surgido do nada, a Deepseek está sediada em Hangzhou, uma metrópole no leste da China onde estão sediados vários dos gigantes da tecnologia do país, o que lhe rendeu o apelido de “Vale do Silício chinês”.
Pouco conhecido no exterior, o DeepSeek já era de grande interesse na China há muito tempo. O bot de conversação R1 da DeepSeek surpreendeu os especialistas com seu desempenho e custo-benefício, considerando os baixos custos de desenvolvimento.
Além disso, a China exaltou sua suposta capacidade de contornar as sanções dos EUA destinadas a bloquear o acesso aos sofisticados chips necessários para a revolucionária Inteligência Artificial (IA).
O modelo de IA do aplicativo chinês é considerado fortemente competitivo com as últimas ferramentas lançadas pela OpenAI e pela Meta. Na segunda-feira, a ferramenta ultrapassou rivais e se tornou o aplicativo mais baixado na App Store, a loja de apps da Apple. No Brasil, o app aparece em sexto lugar na categoria de gratuitos, a frente do ChatGPT, da OpenAI.
“Sinal de alerta”
O sucesso do DeepSeek colocou em questão as quantias colossais investidas pelos gigantes dos EUA no desenvolvimento de IA generativa avançada e a eficácia das sanções ocidentais para impedir que os rivais chineses as igualem ou até mesmo as superem. O presidente dos EUA, Donald Trump, reconheceu esse fato: é um “alerta” para o Vale do Silício.
— Um momento Sputnik — reagiu Marc Andreessen, um renomado investidor do setor, fazendo uma alusão ao choque no Ocidente em 1957, quando a União Soviética colocou em órbita o primeiro satélite artificial.
E isso sob o risco dos planos de Washington de aumentar ainda mais as restrições às empresas chinesas de tecnologia.
Em sua entrevista à Waves, Liang Wenfeng enfatizou no ano passado que essas restrições eram o obstáculo mais difícil de superar:
— O dinheiro nunca foi um problema para nós. O problema é o embargo aos chips de última geração.
No entanto, à parte os altos e baixos geopolíticos, Liang expressou esperança de que o surgimento da IA possa ajudar a entender melhor o funcionamento interno do espírito humano.
— Nossa hipótese é que a essência da inteligência humana pode ser a linguagem, que o pensamento humano pode ser essencialmente um processo linguístico — disse ele. — O que você considera ‘pensamento’ pode ser, na verdade, seu cérebro tecendo uma linguagem.