Passadas as eleições, empresários afirmam esperar maior interlocução com o Estado no novo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para discutir medidas que impulsionem a economia do país. Recriação do Ministério da Indústria não é vista como fundamental, embora seja considerada um caminho possível.
No varejo, há preocupação com a manutenção do Auxílio Brasil e expectativa positiva diante da perspectiva de criação de um amplo programa de renegociação de dívidas. Já no segmento de infraestrutura, o foco principal está em maior previsibilidade para garantir a captação de investimentos e tirar projetos do papel.
No geral, o que se deseja é que o novo governo mantenha diretrizes ortodoxas e faça acenos ao mercado, em especial à indústria.
Dentre as medidas a serem adotadas e já divulgadas, o programa de renegociação de dívidas, chamado Desenrola, tende a ser o de efeito mais rápido em reativação de consumo, beneficiando o varejo, avalia André Peixoto, CEO da Leader, rede varejista fluminense:
— Há muita gente endividada, pessoas que ganham R$ 2 mil e devem mais de R$ 15 mil. Os juros são altos, sobretudo no cartão de crédito e no cheque especial. Fica impagável. Há situações, como agora, que pedem um mutirão, porque as pessoas estão no SPC, sem poder consumir. E já teria efeito no primeiro semestre.
Na opinião dele, o consumo está tão deprimido que um estímulo nessa direção não ampliaria a inflação:
— O Auxílio é um consenso. Sem ele, o país não roda no curto prazo. Já a decisão de aumento real anual do salário mínimo deve surtir efeito ao longo dos próximos quatro anos. É importante lembrar que o desemprego está caindo, mas a renda está lá embaixo.
Tom Moreira Leite, CEO do Grupo Trigo, que reúne marcas como Spoleto e Koni Store, avalia que a revisão das faixas do Simples Nacional, para que o regime alcance maior número de micro e pequenos negócios, e a inclusão do segmento de bares e restaurantes no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse) deveriam estar entre frentes prioritárias.
Ele pede ainda esforço em estratégias, como a desoneração da folha de pagamento, para ampliar a oferta de emprego no segmento, sobretudo para jovens.
Synésio Batista da Costa, dirigente da Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos (Abrinq), frisa que o empresariado tem boas relações com Lula. Ele acredita que a recriação da pasta da Indústria, prometida pelo novo eleito, não é essencial porque careceria de autonomia decisória em relação a outros ministérios como o da Economia.
Para Nelson Mussolini, do Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma), o importante não é ter recriação da pasta da indústria, mas previsibilidade e segurança jurídica na política econômica do governo:
—É preciso ter políticas que estimulem a indústria. Nenhum país desenvolvido prescinde de setor industrial forte. Há clareza na equipe do Lula sobre desenvolvimento da indústria.
Aceno a estrangeiros
Na construção, a expectativa é de avanço diante da proposta de reativação do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e de impulso ao segmento de moradia popular, diz Sylvio Pinheiro, diretor da carioca G+P Soluções, consultoria de gestão e soluções de projetos e construções. O setor, diz ele, permite a Lula dar resposta rápida em ferramentas de estimulo à economia.
— O problema do setor hoje é a taxa de juros. A inflação cedeu e a quebra na cadeia se resolveu. Isso traz o consumidor de forma fácil, ele volta a comprar. E, ao mesmo tempo, destrava projetos — explica ele.
Já o foco em estimular avanço em moradia popular traz confiança para investir:
— Bolsonaro reduziu muito o investimento nas primeiras faixas do programa de moradia popular (Casa Verde e Amarela). É um investimento baixo perto do resultado percebido pela população. É uma forma fácil de movimentar a máquina, gerando emprego. Projetos foram travados pelas empresas porque a conta não fechava.
A sinalização de freio em privatizações não deve alcançar o saneamento, acredita Marilene Ramos, diretora de Relações Institucionais e Sustentabilidade do Grupo Águas do Brasil.
No setor, a visão é que não deve haver revisão do Marco do Saneamento, que tem permitido captar investimento privado para acelerar a universalização dos serviços de água e esgoto no país.
Paulo Hartung, à frente da Indústria Brasileira de Árvores (Ibá), diz que a mudança de governo é oportunidade de “corrigir o rumo” das políticas ambientais do país:
— Tem uma expectativa grande do setor sobre a questão ambiental. É algo importante para a economia brasileira porque mexe com a imagem do Brasil junto a investidores estrangeiros. Há uma oportunidade de corrigir o rumo para que o país volte a participar de esforços no combate às mudanças climáticas.
De outro lado, o executivo Christian Lohbauer, que até outubro presidia a Croplife, entidade ligada ao agronegócio, diz que a gestão de Lula precisa ajustar o discurso para não ter atrito com o segmento:
— Precisa prestar atenção no que vai fazer em relação ao agro porque não foi a escolha da imensa maioria do setor. E abandonar pautas como taxação de exportação e de commodities e ocupação de propriedade privada.
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