Prestes a completar dois anos de mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva subiu o tom contra o que chamou de “erros” na comunicação do seu governo e afirmou que fará mudanças na área a partir de janeiro. Ao discursar em um evento do PT, o presidente disse entender ser necessário fazer “correções” para que sua gestão consiga combater a extrema-direita nas redes sociais.
Uma resolução do partido, que deve ser chancelada em reunião hoje, também cobra uma melhor estratégia na divulgação de ações positivas da administração petista, como mais pronunciamentos em cadeia de rádio e televisão. As críticas aumentaram a pressão para a demissão do ministro Paulo Pimenta, da Secretaria de Comunicação Social (Secom), um dos cotados para sair em uma eventual reforma ministerial.
— Há um erro no governo na questão da comunicação e eu sou obrigado a fazer as correções necessárias para que a gente não reclame de que a gente não está se comunicando bem — disse Lula durante encerramento de um encontro do PT em Brasília.
A participação do presidente no evento se deu via videoconferência, com seu discurso sendo transmitidos aos militantes petistas por meio de um telão. Além das críticas à comunicação do governo, ele cobrou que o próprio partido atue de forma mais integrada para divulgar ações de sua gestão. Ele admitiu ainda parte da culpa e prometeu passar a conceder mais entrevistas coletivas para combater discursos difundidos pela oposição.
— Alguma coisa precisa ser mudada para que as pessoas tenham acesso àquilo que nós estamos fazendo. Essa é uma das minhas preocupações que quero começar a resolver no começo de ano e quero resolver junto com o partido — afirmou o presidente.
Uso das redes
Ao falar aos correligionários, o presidente afirmou que o governo e o PT não sabem usar a internet como a extrema direita e que em dois anos nem sequer se conseguiu fazer pesquisas aprofundadas sobre a comunicação digital. O presidente reclamou que cada militante, deputado e senador petista tem sua própria rede social, sem um discurso uníssono:
— Nós não temos uma digitalização do PT que pense e fale a mesma linguagem durante todo o dia nesse país. Isso é uma coisa que vamos ter que levar em conta nesses dois anos que faltam para terminar meu governo. Começar inclusive fazendo licitação para que a gente tenha a questão da digitalização levada muito a sério.
A Secom chegou a realizar uma concorrência no início do ano para contratar empresas que pudessem atuar na comunicação digital do governo. O certame, de R$ 197,7 milhões, foi suspenso em julho pelo Tribunal de Contas da União (TCU) por fatos de “extrema gravidade”, como a suspeita de violação do sigilo do processo.
À frente da pasta no Palácio do Planalto desde o início do mandato, Pimenta é um dos auxiliares mais próximos a Lula, mas não foi a primeira opção para o cargo. Durante a transição, o petista chegou a convidar o publicitário Sidônio Palmeira, que foi o marqueteiro da campanha eleitoral de 2022, mas ele rejeitou integrar o governo.
Além das críticas de Lula, a ofensiva contra a comunicação do governo também estará presente na resolução que a Direção Nacional do PT aprovará em reunião neste sábado. O documento cobra, por exemplo, mais pronunciamentos em cadeia de rádio e televisão nos moldes do feito em 27 de novembro pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para anunciar o pacote de cortes e gastos e o aumento da faixa de isenção do imposto de renda.
O texto foi elaborado pela corrente majoritária do partido, a CNB, e será apreciado pelos demais grupos internos. Em geral, os documentos da CNB, corrente de Lula e da presidente da legenda, Gleisi Hoffmann, são aprovados. Podem ainda, porém, ser feitas emendas ao texto.
O pronunciamento de Haddad para explicar o pacote de ajustes da economia teve ares de propaganda eleitoral, incluindo números positivos da economia saltando na tela, imagens de Lula no G20 ao lado de líderes mundiais, cenas de obras e de famílias felizes com panelas cheias. Sobre o tema, o texto da corrente majoritária do PT afirma: “A utilização de transmissões em cadeia nacional de rádio e TV deveria ser uma constante nas atividades da Presidência e dos ministros e ministras que integram pastas cruciais, e não uma estratégia limitada a datas como o 7 de setembro”, diz trecho da resolução.
Principais tópicos da resolução petista
Não à anistia: O PT sugere “sepultar a proposta para anistiar os golpistas” e cobra a punição a “Bolsonaro” e a todos os envolvidos na tentativa de golpe.
Extrema-direita: “O enfrentamento contra o radicalismo violento da extrema direita bolsonarista permanece uma prioridade inegociável”, ressalta o texto.
Forças Armadas: Retomar a articulação de uma PEC que altera o artigo 142 sobre as Forças Armadas e estabelece que elas não possuem poder moderador.
Articular e comunicar: priorizar aliados, dialogar com as bases, seja ela católica ou evangélica, uso maior de cadeia de rádio e TV e melhoria na comunicação digital.
Regras para bets: a regulamentação das apostas on-line é apontada como umas prioridades. O texto classifica a atividade como uma exploração “da boa-fé”.
Super-ricos: A taxação do patrimônio dos super-ricos, seguindo “as maiores economias do mundo”, deve ser central nas articulações do governo em 2025.
Foco no trabalhador: trabalhar pela tarifa zero no transporte (criação de um sistema único de mobilidade universal e gratuito, aos moldes do SUS) e fim da escala 6×1.
Combate à fome: até o fim do mandato atual, erradicar completamente a fome — o texto cita “o ocorrido em 2014”. Combater a alta dos preços dos alimentos.
“Timidez dos porta-vozes”
Em outra crítica ao governo, o documento ressalta que nem sempre as realizações da gestão Lula são percebidas pela sociedade “devido à timidez de vários dos nossos porta-vozes em travar abertamente o debate e a disputa política contra as forças conservadoras e reacionárias”.
Nos bastidores, ministros minimizaram as críticas e afirmaram que o posicionamento do PT mostra que o partido não é chapa branca e cujo perfil é manter a disputa política em relação ao governo.
— As sugestões e contribuições do PT e dos demais partidos da base são sempre bem-vindas. Com certeza vamos levar em conta e analisar as opiniões — afirmou Pimenta sobre a resolução do partido. Ele não comentou as críticas feitas pelo presidente.
Ao tratar de economia, o documento adota outro tom ao exaltar o anúncio da elevação da faixa de isenção do imposto de renda para quem ganha até R$ 5 mil e ataca o mercado financeiro ao atribuir a alta do dólar a especulações.
Em outro trecho, o texto da CNB afirma que a chegada de Gabriel Galípolo à presidência do Banco Central, em janeiro, “deve garantir que as políticas monetárias futuras estejam alinhadas com os objetivos de crescimento inclusivo e sustentável do governo Lula”. O texto também defende o fim da jornada de trabalho 6×1 (seis dias de trabalho por um de descanso), de 44 horas para 36 horas semanais, como consta de proposta de emenda à Constituição (PEC) apresentada pela deputada Erika Hilton (PSOL-SP).
No embate entre governo e MST (leia mais na página 5) em razão das metas de assentamentos para o próximo ano, o partido se coloca ao lado do movimento. Os petistas cobram que o ministro Paulo Teixeira, ministro do Desenvolvimento Agrário, cumpra a meta de assentar 60 mil famílias. “O governo precisa articular uma resposta à altura dessa justa e histórica reivindicação dos nossos irmãos e irmãs rurais”, afirma o texto.
O entorno de Teixeira afirma considerar natural a tensão na relação entre governo e movimento social e que o grupo está no seu papel de reivindicar, enquanto o governo precisa priorizar e organizar entregas.
— O governo Lula retomou a reforma agrária através do programa Terra da Gente cuja meta é assentar 60 mil novas famílias até 2026 — disse Teixeira.
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