Após Lula chamar proposta europeia de “ameaça”, Macron debate acordo com Mercosul

No almoço oferecido pelo presidente francês Emmanuel Macron ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no Palácio do Eliseu, nesta sexta-feira (23), além do bacalhau servido, havia um cardápio com itens indigestos: o acordo de livre comércio entre a União Europeia (UE) e o Mercosul e o conflito russo-ucraniano, dois pontos de discordância entre Brasil e França.


No primeiro deles, Lula repetiu ao colega francês o que já havia dito pela manhã no encerramento da Cúpula para um Novo Pacto Financeiro Global: o Brasil considerou inaceitável a side letter — um adendo que, na prática, amplia e modifica o acordo — exigindo novos compromissos ambientais como requisito para a assinatura do documento.


O brasileiro reafirmou que uma carta-resposta será discutida na próxima cúpula de chefes de Estado do Mercosul, em Puerto Iguazú, no Argentina. A ideia é que a missiva seja enviada a UE antes da cúpula dos europeus com a Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), em Bruxelas, Bélgica, nos dias 17 e 18 de julho.




O impasse, por enquanto, permanece, mas Macron prometeu um esforço para que seja alcançado um consenso nesta questão e que se possa, finalmente, avançar para a conclusão do acordo.


No tema da guerra na Ucrânia, os dois líderes não conseguiram convergir e mantiveram suas próprias convicções em relação ao conflito. Lula repetiu que o Brasil não vai entrar na guerra e não fornecerá armamentos para os ucranianos, o que tem sido feito por europeus e americanos. A visão brasileira defende que o confronto seja suspenso e iniciadas negociações de paz. Tudo o que a aliança transatlântica não aceita.


Macron argumentou que houve um agressor — a Rússia — e um agredido — a Ucrânia, com direito a se defender —, e que o agressor não pode sair do conflito com vantagens e novos territórios conquistados. Ambos, no entanto, celebraram a convocação pela Ucrânia de uma reunião em Copenhague, na Dinamarca, com os países do G7 mais Brasil, África do Sul, Índia e China para discutir uma solução para a guerra que já se estende por um ano e quatro meses.


No plano da defesa, foi abordado o programa de construção do primeiro submarino nuclear brasileiro, em parceria com a França, e os aspectos de transferência de tecnologia. Na área cultural, cogita-se reeditar o ano do Brasil na França, e também o da França no Brasil, promovidos em 2005 e 2009, respectivamente.


Lula solicitou mais investimentos franceses no Brasil na área de transição energética, e convidou Macron para participar da cúpula dos países amazônicos, em agosto. Um enigmático Macron respondeu:


— Você pode contar com o meu engajamento nos dois temas — disse, sem confirmar explicitamente sua presença no encontro amazônico.


Brasil e França estabeleceram uma parceria estratégica em 2006, de promoção do diálogo político e de relações econômicas e comerciais. Está em elaboração uma atualização desta parceria, que o governo francês pretende como “mais ambiciosa”. O novo plano de ação entre os dois países estava previsto para ser anunciado no primeiro semestre deste ano, mas atrasou, e por enquanto não há ainda um novo prazo estabelecido.

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