A Polícia Federal (PF) prendeu nesta quarta-feira um grupo criminoso que planejava realizar ataques contra servidores públicos e autoridades, entre eles o senador Sergio Moro (Podemos-PR) e o promotor de Justiça de São Paulo, Lincoln Gakiya. Além dos desdobramentos das investigações que resultaram na ação policial batizada de Sequaz, o caso deixou também o ambiente político do país em polvorosa. Políticos como o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) buscaram vincular sem provas o plano criminoso à “esquerda”, enquanto o governo do presidente Lula (PT) repudiou tentativas de politizar o episódio.
Entenda o caso:
1 – O que é a operação Sequaz?
De acordo com a PF, uma facção criminosa de São Paulo planejava realizar ataques contra servidores públicos e autoridades em cinco estados: Rondônia, Paraná, Distrito Federal, Mato Grosso do Sul e São Paulo. Ao todo, foram expedidos 24 mandados de busca e apreensão, sete mandados de prisão preventiva e quatro mandados de prisão temporária contra suspeitos e endereços situados em Rondônia, Mato Grosso do Sul, São Paulo e Paraná. Nove pessoas já foram presas e duas continuam foragidas.
Entre os alvos de mandados de prisão temporária e preventiva da Operação Sequaz, há integrantes da cúpula da maior facção criminosa do país que têm anotações por furto, roubo, tráfico de drogas e até sequestro e cárcere privado. A corporação apreendeu uma moto, maços de dinheiro em um cofre, relógios, colares de ouro e um carro de luxo.
2 – Quem eram os alvos?
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, informou que entre as possíveis vítimas estava um senador e um promotor de Justiça. O ex-juiz e atual senador Sergio Moro disse que seria um dos alvos do grupo criminoso. Outro alvo dos criminosos, o promotor Lincoln Gakiya integra o Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado de São Paulo (Gaeco). Dedicado há 17 anos a combater as ações desse grupo, Gakiya foi o responsável por transferências de chefes como Marcos Camacho, o Marcola, para presídios federais e vive atualmente sob escolta e vigilância após uma série de ameaças que sofreu. O promotor teria tido uma sentença de morte determinada pelo chamado tribunal do crime da facção e passado a receber ameaças.
O inquérito apontou ainda que os bandidos alugaram imóveis próximos a endereços de Sergio Moro e se revezavam no monitoramento dele e de sua família, em Curitiba, no Paraná. Eles chegaram a cogitar, inclusive, a possibilidade de sequestro-lo para negociar a liberação de Marcos Camacho, o Marcola, apontado como chefe da facção.
3- Por que os criminosos planejavam matar Moro?
Sergio Moro diz acreditar ter se tornado alvo do plano como uma forma de retaliação por medidas contra facções criminosas tomadas quando ele era ministro da Justiça e Segurança Pública no governo Bolsonaro. Ele ocupou a pasta quando ocorreu a transferência de chefes de facções para presídios federais. No total, pelo menos 113 presos de quatro estados foram transferidos. Entre os chefes de facções transferidos para presídios federais estava Marcola, o líder da facção paulista que planejou os atentados.
Além das transferências, Moro editou, no início de 2019, uma portaria endurecendo as regras das visitas nos presídios federais. A medida baniu o contato físico entre detentos e visitantes, estabelecendo que os encontros só ocorreriam no parlatório, onde um vidro separa os presos de familiares e amigos, que passaram a só se comunicar por meio de interfone.
4-Moro já sabia que era um dos alvos do plano?
Segundo a colunista do Globo Bela Megale, o senador foi alertado no fim de janeiro que estava em andamento o plano de uma facção criminosa contra ele e integrantes de sua família. A informação chegou ao ex-juiz e membros de sua equipe por meio do Gaeco, do Ministério Público de São Paulo. O promotor Lincoln Gakiya, que atua no Gaeco, também era um dos alvos da facção.Com isso, foi implementado um novo protocolo de segurança envolvendo Moro, sua esposa, a deputada federal Rosangela Moro, e os filhos do casal, com reforço da equipe.
5 – Repercussão no meio político
A operação da PF reverberou no meio político e parlamentares foram às redes para comentar o caso. O senador Flávio Bolsonaro, pelo Twitter, questionou a autoria do plano para matar o ex-ministro de seu pai. “Quem queria matar Moro”, perguntou.
Já a presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, comentou em suas redes a relação conturbada do presidente Luiz Inácio Lula da Silva com o ex-juiz Sergio Moro ao tratar do tema, destacando o papel do governo em proteger Moro e sua família.
“Juiz parcial, que não se importou com o ódio que alimentou com a Lava Jato, tem aula de civilidade e democracia do governo Lula”, publicou.
O deputado federal e ex-procurador da República Deltan Dallagnol (Podemos-PR) prestou solidariedade ao senador Sérgio Moro. Ele, que era um dos responsáveis pela operação Lava-Jato, afirmou estar chocado com os planos criminosos.
“Chocado, indignado e motivado a lutar ainda mais contra o crime. Minha total solidariedade a Sergio Moro e sua família, pessoas de honra que querem e lutam por um Brasil melhor. Os criminosos querem vingança”, postou o parlamentar.
6-Politização e acusações sem provas
A ação criminosa desbaratada pela PF também serviu de munição para uma tentativa de politizar o assunto. O ex-presidente Bolsonaro tentou vincular o plano para assassinar o senador à esquerda. Sem provas, ele fez uma associação do caso ao assassinato em 2002 do ex-prefeito de Santo André (SP), Celso Daniel, e à facada contra ele mesmo, em 2018.
“Em 2002 Celso Daniel, em 2018 Jair Bolsonaro e agora Sérgio Moro. Tudo não pode ser só coincidência. O Poder absoluto a qualquer preço sempre foi o objetivo da esquerda”, escreveu Bolsonaro.
No início da tarde, o ministro da Justiça e Segurança Pública Flávio Dino (PSB) criticou a tentativa de agentes políticos de politizar a ação, sem mencionar Bolsonaro ou outros nomes
— É vil, leviana e descabida qualquer vinculação a esses eventos com a política brasileira. Eu fico realmente espantado com o nível de mau carátismo de quem tenta politizar uma investigação séria. Investigação essa que é tão séria que foi feita em defesa da vida e da integridade de um senador de oposição ao nosso governo — afirmou o ministro.
7- Fala de Lula é usada por oposição
Uma declaração dada pelo presidente Lula ao site “Brasil 247″ na terça-feira também se tornou material para falsas associações de deputados bolsonaristas nas redes. O petista relembrou na entrevista quando estava preso e dizia que só iria ficar bem quando “foder esse Moro”.
O deputado federal Filipe Barros (PL-PR) disse que a fala de Lula era “a autorização que o PCC precisava para executar o plano” contra Moro. Carla Zambelli (PL-SP) também dez postagens sobre o caso. “Troquem os personagens e imaginem se fosse Bolsonaro no lugar de Lula. A imprensa lulista estaria pedindo a prisão dele. Hoje, ela tenta passar pano para a fala criminosa de lula que, segundo ele, não foi de ontem, era recorrente. E por ela ele deve ser responsabilizado!”, escreveu Zambelli.
Petistas e membros do governo reagiram condenando a associação feita pelos bolsonaristas. Ministro da Secretaria de Comunicação da Presidência da República, Paulo Pimenta afirmou que não há qualquer vinculação entre a fala de Lula e a operação realizada pela PF. Ele lembrou que a investigação vem sendo feita desde janeiro. Já o recrutamento de agentes para desencadear a ação ocorreu no dia 16. Só na terça-feira, Lula falou sobre o desejo de vingança contra Moro quando ainda estava preso.
— Querer fazer esse vínculo é uma estratégia perversa — disse o ministro.
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